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03 maio 2024 04h45

Pequenos empresários dos EUA mais pessimistas

Vida económica

O dado preliminar do PIB dos EUA referente ao primeiro trimestre deste ano, publicado na semana passada, surpreendeu pela negativa, corroborando uma economia americana em desaceleração, tendo a economia dos EUA crescido apenas 1,6%, muito abaixo dos 3,4% do último trimestre de 2023, inferior também às expectativas dos economistas de 2,5%. Agravando igualmente esse cenário macroeconómico, a inflação acelerou, tendo o deflator do PIB subido 3,1% nos primeiros três meses de 2024, muito acima de 1,7% do último trimestre de 2023, mostrando uma persistência dos preços no consumidor, suportados sobretudo pelas rendas de casa e equivalentes (o denominado shelter do IPC) e pela subida do preço da gasolina.


Os gastos do consumidor foram responsáveis por grande parte do crescimento do PIB, mais precisamente 1,7 pontos percentuais (pp), mas o aumento do défice externo penalizou, tendo as importações aumentado 1 pp, enquanto as exportações subiram apenas 0,1 pp. A contribuir positivamente esteve também o investimento, tendo os gastos empresariais aumentado 0,9 pp, à medida que as empresas gastaram mais com bens e serviços relacionados com a inteligência artificial. Os gastos públicos aumentaram apenas 0,2 pp, um quarto apenas dos gastos governamentais entre outubro e dezembro do ano passado. Por último, a variação de stocks foi desfavorável, tendo diminuído, subtraindo 0,35 pontos ao PIB. Em suma, este foi o resumo dos números preliminares do PIB dos EUA na ótica da despesa.


O crescimento do PIB de apenas 1,6% no primeiro trimestre deste ano foi o mais baixo desde a recessão técnica no primeiro semestre de 2022. A economia americana começa gradualmente a sentir os efeitos nefastos da subida de 525 pontos base das Fed Funds Rate em apenas 17 meses, de 0,25% em 16 de março de 2022 para 5,50% em 26 de julho de 2023.


A atividade do setor dos serviços, medida pelo PMI não Manufatureiro ISM, mantémse há mais de um ano acima dos 50 pontos, nível que separa expansão de contração, mas muito ligeiramente, tendo descido para os 51,4 pontos em março. Entretanto, o sentimento industrial, medido pelo PMI manufatureiro ISM, recuperou dos mínimos de 46,4 pontos em junho do ano passado, tendo regressado a território positivo de 50,3 pontos em março. O indicador PMI (Purchasing Managers Index) medido pelo ISM (Institute for Supply Management) mede o sentimento das maiores 600 ou 700 empresas dos EUA, muito parecido com o PMI coletado pelo S&P Global que representa um universo de 1300 empresas, mas estamos a falar sempre de grandes empresas. Ou seja, os PMI manufatureiro e não manufatureiro medidos pelo ISM estão acima de 50, refletindo crescimento económico, apesar de muito ligeiro. Entretanto, o NFIB (National Federation of Independent Business), principal índice de otimismo das pequenas empresas dos EUA, mostra uma realidade diferente, tendo diminuído em março para 88,5, o nível mais baixo desde dezembro de 2012. O NFIB é a voz das pequenas empresas dos EUA e dos interesses dos seus proprietários. São empresas independentes, ou seja, de proprietários privados, mas sem estrutura acionista, podendo empregar até centenas de trabalhadores. Não há uma definição padrão de "pequena empresa”, mas em média são empresas que empregam 10 pessoas e publicam vendas brutas anuais à volta de meio milhão de dólares, respondendo por cerca de 50% da força de trabalho privada americana.


Enquanto os empréstimos às pequenas empresas têm prazos relativamente curtos, no início da curva de rendimentos, sobretudo concedidos pela banca, a tesouraria destas pequenas empresas é relativamente escassa, não usufruindo, assim, das taxas de juro de 5,4% pagas pela Reserva Federal nos fundos do mercado monetário. Assim, a subida das taxas de juro pela Fed há muito penalizam estas pequenas empresas, corroborando a gradual deterioração dos seus negócios, estando estas a contratar e a investir cada vez menos, arrastando o índice de otimismo do NFIB para mínimos dos últimos 12 anos, permanecendo abaixo dos 100 pontos, nível que separa otimismo de pessimismo, desde agosto de 2021. Entretanto, muitas grandes empresas, sobretudo as que têm uma dívida líquida negativa, ou seja, a sua tesouraria e equivalentes é superior aos montantes dos seus empréstimos (Enterprise Value inferior ao market cap), beneficiando da alta das taxas de juro, investindo a sua liquidez no mercado monetário a render 5,4% e pagando pelos seus empréstimos ainda taxas de juro relativamente baixas de 0% ou 1%. As grandes empresas têm acesso facilitado aos mercados financeiros, emitindo obrigações com prazos mais dilatados, na parte mais longa da curva de rendimentos. Assim, enquanto as pequenas empresas são cada vez mais castigadas pelas elevadas taxas de juro, as grandes empresas apenas vão sentindo essas penalizações à medida que as suas dívidas vencem e são substituídas pelas atuais taxas de juro. Este gradual processo promete deteriorar o crescimento económico dos EUA num futuro não muito distante.